desaparecer no horizonte

Olho para o céu e não sei com quem falo.

Tudo ao meu redor sente o vento. As franjas da rede, todas as árvores da rua, as roupas no varal, as cortinas nas janelas. O capacho, o portão mal fechado do vizinho, o saco de lixo. Uma dança de objetos sem vida.

A janela da frente costumava ser a do quarto dos meus avós. O armário ainda é o mesmo, mas hoje é só mais um quarto.

As ondas do tempo explodem, os dias se repetem, um segundo substitui o outro. Dar forma ao caos e, no meio da loucura, encontrar algum sentido que não existe de verdade.

Que sonhos a gente tem quando morre?

Também as palavras são poeira de estrelas.

Flutuam de volta.

O colorido na asa de uma borboleta.

Furo uma onda e volto à superfície carregando o mar dentro de mim.

Voltar à superfície.

Desaparecer no horizonte.

O vento retorceu a rede e carregou folhas secas para o piso da área. Não varri. A vida se encarrega. Tem sido minha resposta há quase 30 anos.

Enquanto assisto à natureza ser natureza, quase sentindo frio, o café esfria na caneca ao meu lado. O livro descansa aberto sobre a almofada. As páginas do caderno vão e voltam com o vento. Não sei se violência é uma palavra que pode ser usada com a natureza. Violência é coisa nossa. Humana. O resto é consequência.

Para onde vou no domingo?

Ano que vem eu só queria não sentir essa angústia. Mas às vezes acho que já somos a mesma coisa, eu e ela.

Dos fundos da casa vem um pequeno estrondo: o vento bateu a porta.

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